sexta-feira, 27 de fevereiro de 2015

Um mundo melhor é possível!


Talvez muita gente não entenda quando alguém se diz socialista, tem ideais maiores que o próprio umbigo e luta por uma causa que acredita trazer maior justiça social.
Eu sei que para alguns é difícil entender essas pessoas… assim como pra mim, que me solidarizo com muitos ideais sociais, é difícil entender como algumas pessoas conseguem viver o dia a dia alheias aos absurdos de um mundo tão desigual.
E aí reside uma certa dúvida, será que as pessoas realmente vivem bem o dia a dia alheias a isso tudo, ou será que estão só fingindo, ocultado seu desconforto, seus medos, sua indignação?
Pensando nisso, percebi que também não sei em que medida quem está ao meu redor tem noção da minha indignação… Será que sabem que todos os dias quando volto para casa do trabalho eu volto pensando sobre o tipo de sociedade em que vivemos?
Pois é, acho que é raro o dia em que eu não reflita sobre as diferenças sociais absurdas e gritantes, injustificáveis e obscenas, às vezes veladas em bairros ou países afastados e distantes do olhar, às vezes escancaradas no rosto sofrido ou na simples presença de um ser humano cuja dignidade talvez esteja perdida nas cifras da conta de algum empresário bilionário na Suíça!
Sempre que me deparo com alguém pedindo esmola na rua, seja mãe e filha na calçada, garotos no semáforo, homens carrinheiros, pessoas aparentemente malucas gritando na rua, mal vestidas, sujas, errantes, ou mesmo quando um ou outro pedinte vem procurar uma “ajudinha” em casa, eu me revolto. Não há vez em que não me passe pela cabeça a pergunta sobre o tipo de sociedade que nós construímos, vivemos e mantemos todos os dias!
Ao mesmo tempo, quando vou ao shopping, quando vejo mansões, casas absurdamente enormes, luxo, ostentação, futilidades mil em programas televisivos que tentam normalizar todos os tipos de gente e até mesmo em pessoas próximas que estão mais preocupadas com o look do dia para arrasar, igualmente considero essas cenas grotescas, obscenas, e o questionamento não é diferente.
Não é possível que tanta gente olhe para essas situações, essas pessoas e ache mesmo que está tudo certo?! Será?
Se muitos não se comovem, não pensam sobre isso, preferem ignorar, olhar para o outro lado e fingir que não veem tanto quanto possível, eu não sei, não consigo ser indiferente.
Já escrevi tanta coisa sobre isso, e tive tantas conversas com pessoas mais próximas que pode ser chato ficar repetindo.
Até por isso, posso não falar nada na maioria das vezes e aparentemente fazer o mesmo seguindo em frente, mas toda vez, TODA VEZ, cada uma dessas pessoas, cada uma dessas situações me marca de forma tão profunda que acho que nem é possível expressar em palavras, mas gera cicatrizes tão grandes, que só me fazem questionar ainda mais!
Um dia li uma frase de um filósofo indiano chamado Jiddu Krishnamurti que diz:
“Não é sinal de saúde estar bem adaptado a uma sociedade profundamente doente”.

Essa frase até me causou certo conforto, porque realmente nunca me senti muito bem e nem muito adaptada a essa sociedade, e nada me fez tanto sentido quanto pensar que ser “normal” em um mundo tão absurdo não é muito recomendável!
Lembro de pensar muito sobre tudo isso há anos e de ter prometido a mim mesma em algum momento que não ia me conformar e simplesmente aceitar as coisas como são. Acho que foi um voto de indignação, e nem precisava prometer nada, é só sair na rua, ver TV ou ler notícias que a revolta é espontânea!
Não foi a toa que recentemente fui a Cuba. Com tantos questionamentos fui também para ver se lá havia alguma coisa diferente, se outra maneira de viver ou de fazer as coisas é possível.
Muitos que são constantemente bombardeados pelas informações distorcidas de uma mídia dominante e elitista podem se surpreender, mas indo pra lá, apesar de todos os pesares, pude reafirmar vários de meus ideais, gerar novas convicções do que antes eram dúvidas, e ver que realmente um mundo muito melhor é possível, ou no mínimo, um mundo mais justo e igualitário!
Mesmo havendo alguma diferença social, nada é tão gritante e indignante, e naquele país que se diz socialista, mas que tão poucos entendem, ainda que as pessoas sejam mais simples e vivam com menos coisas, vivem bem e com dignidade, e talvez seja justamente esse o ponto.
Talvez elas não saibam e nem nós conseguimos entender, mas pode ser bem por isso, por viver com menos, que eles sejam mais felizes, sem tantas coisas supérfluas, inúteis e sem a variedade e opções de compras que às vezes nos geram até uma ansiedade por não conseguir saber o que é o melhor pra cada um.
Ainda que muita gente tenha dificuldades quanto ao poder de compra de seus salários e esteja insatisfeita, particularmente nesse ponto não vejo nenhuma diferença quanto ao que vivenciamos no mundo capitalista, a única diferença é que ao menos lá, um mínimo para uma vida DIGNA é garantida à população, e todos estão lutando e trabalhando em conjunto, com um espírito social e coletivo, visando sustentar de forma quase que inacreditável um modo de vida que vai de encontro aos padrões exteriores, imposições, embargos, bloqueios econômicos e todas as adversidades impostas ou existentes em uma ILHA que por muito pouco não parou no tempo!
Uma das curiosidades que eu tinha era a de saber se é verdade o que diz a tal frase de Fidel Castro:

“Essa noite milhares de crianças dormirão na rua,
nenhuma delas é cubana”.

E é impossível explicar quão emocionante foi ir até lá e ver que é verdade, constatar que realmente não tem gente dormindo nas ruas, ninguém pedindo esmola nos sinaleiros, nem carregando carrinhos de papelão, catando comida em lixões, nem gente suja e maltratada sem rumo e sem casa. Impossível explicar isso aos indiferentes! Mas para quem compartilha dos mesmos ideais e indignações é até fácil de imaginar, não é mesmo?
Para não dizer que estou mentindo, um dia cheguei a ver um bêbado dormindo na praça, vi também algumas pessoas pedindo moedas aos turistas e a galera em geral pede os famigerados “regalitos” (presentinhos). Claro que também é possível de vez em quando ver um maltrapilho, mas é até estranho quando nos deparamos com algo assim em Cuba, porque é quantitativamente tão pouco que a gente se surpreende!
Também é verdade que há um déficit de moradias por lá, algo que não se oculta de ninguém, mas isso não significa que há indigentes e moradores de rua, mas sim que muitas vezes os filhos casam e acabam morando na mesma casa, ou com outros arranjos familiares semelhantes, o que obviamente não é muito conveniente, mas que ainda assim acho que é melhor do que dormir embaixo do viaduto.
Certamente, como é fácil ver e os próprios cubanos dizem, Cuba não é um paraíso e está longe de ser uma utopia, não há nada perfeito nem lá, muito menos aqui, mas tem algo que talvez só dê pra entender vivendo essa experiência, que diz respeito à dignidade do povo, uma dignidade que em outros lugares do mundo, principalmente nos outros países da América Latina, é roubada toda vez que alguém passa fome, toda vez que alguém dorme na rua por não ter casa ou morre nas filas de hospitais por não ter dinheiro pra pagar um plano de saúde.
Diferentemente de tanta gente carente de tudo nessa nossa terra dita “livre”, naquela terra supostamente sem liberdades pude ver que até mesmo os meninos que pedem moedas nas ruas estão bem alimentados, vestidos e tem uma boa educação, até mesmo para reclamar do governo, coisa que dizem as más línguas ser “proibido”, mas que sinceramente não passa de um boato, a galera é culta e politicamente ativa e de opinião!
Isso tudo em uma ilha que sofre um bloqueio econômico décadas em um mundo globalizado! Parece ser algo incrível não é mesmo?
Eu pensava justamente isso, mas depois de dar uma volta pelo caribe comecei a achar que incrível mesmo somos nós, os ditos “livres”, democratas e igualitários com tamanha “riqueza”, tecnologia, capacidade intelectual e que fomos até a lua e voltamos, sermos tão medíocres e ridículos ao ponto de não conseguirmos sequer acabar com a fome no mundo ou no nosso bairro! Isso sim é inacreditável!
Enquanto isso, numa ilhota quase que isolada do mundo as crianças estão nas escolas, os idosos recebendo atenção e tratamento em instituições adequadas, os doentes sendo tratados, a saúde é promovida e a doença prevenida, e ao invés de desemprego o que existe é uma lei que proíbe não trabalhar! Por isso, jovens, homens e mulheres saudáveis estão trabalhando, nem que seja no próprio negócio!
Para quem não acredita, basta olhar os índices de IDH, qualidade de vida, saúde, educação, expectativa de vida, mortalidade infantil, da ONU, da Unicef, da WWF, entre outros, que são os melhores da América Latina!
Nesse mundo maluco que vivemos é difícil para muita gente pensar que talvez viver com menos pode ser sinônimo de qualidade de vida, ou que se pode viver melhor sem tanta bugiganga, roupas, produtos de beleza, trocentas marcas de cereais, eletrônicos, carros, etc...
Já eu que sempre tive minhas suspeitas só as fortaleci, principalmente ao parar para pensar no stress a que somos submetidos diariamente, o mal do século para nós, mas que nem de longe vi em Cuba, nem a ansiedade constante, o medo de perder o emprego ou de ficar sem o que comer, como alguns poderiam supor após assistir “reportagens” sobre o país, que passam em emissoras dominantes daqui.
Diferentemente do que dizem alguns arautos do apocalipse, não vi nem na capital nem no interior em nenhum momento falta de comida, de produtos de higiene ou de bens essenciais como alguns podem supor por conta de eventuais propagandas ideológicas ou pedidos de envio de produtos. O que tem mesmo é falta de variedade, não tem várias marcas nem produtos mais elaborados acessíveis aos cubanos nas vendas e lojas, mas há uma versão simples de quase tudo que temos, e hoje pelo menos não lhes falta nada de essencial.
Sobre isso aliás, acho que é importante lembrar que para entender Cuba além de buscar informações não distorcidas também é preciso ter uma noção da história do país, antes e depois da revolução, durante o período de ajuste e atualmente. São momentos bem diferentes que repercutiram e ainda repercutem muito na vida das pessoas.
Além isso, também é sempre preciso muito cuidado com o que se ouve falar e a origem das informações, porque a guerra ideológica pode ser muito maior e mais intensa do que a guerra armada!
Eu, por exemplo, não vi nenhuma pobreza em Cuba, apenas simplicidade! É uma diferença sutil que muita gente pode não entender. Talvez sejam as mesmas pessoas que nunca vão compreender a minha indignação com nossa sociedade, e que sequer vão se importar quando virem o próximo ser humano procurando comida no lixo, mas se alguém tem dúvidas ou acha que é tudo mentira, que as pessoas não podem sair do país, que ninguém pode falar mal do governo ou reclamar da vida, sugiro fortemente que vá e crie sua própria opinião também!
Enquanto isso, continuarei acreditando e lutando por um mundo melhor e uma vida mais justa, porque toda vez que deito e tenho um quarto, uma cama e um travesseiro, me entristece profundamente saber que nem todos tem o mesmo conforto. 
Por outro lado, a esperança continua, porque pelo menos em algum lugar do mundo sei que ninguém está dormindo nas ruas. Algo que deveria ser normal, mas que infelizmente ainda é revolucionário!

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